Nelson Rodrigues – Anjo negro A inovação do teatro brasileiro começa na primeira metade do século XX com a chegada dos emigrantes europeus, como o polaco Zbigniew Ziembiński, que é considerado um grande inovador do teatro brasileiro. Neste «boom» do teatro moderno brasileiro aparece o dramaturgo muito apreciado até hoje em dia – Nelson Rodrigues. Nelson Rodigues nasceu em Recife em 1912, em 1916 mudou para o Rio de Janeiro onde viveu e morreu em 1980. Foi jornalista e escritor, é conhecido sobretudo como dramaturgo. Em 1941 publicou a sua primeira peça A mulher sem pecado, depois, em 1943 publicou uma das suas peças mais famosas – Vestido da noiva. O crítico Sábado Magaldi dividiu obra de Nelson em três grupos, as duas obras mencionadas fazem parte do grupo das peça psicológicas. Além das obras psicológicas, a sua obra é dividida entre peças míticas e tragédias cariocas. Peças míticas são representadas, por exemplo, pelas obras Album da família e Anjo negro. A peça Anjo negro, que é apresentada em três atos, foi escrita em 1946, chegou a ser censurada e foi publicada em 1948. A obra, que mostra sobretudo problemas raciais e violência sexual, conta a história de Virgínia e Ismael. A peça começa com a morte do filho recém-nascido do casal. Sabemos que a relação entre casal da branca Virgínia e do médico preto Ismael está marcada pela opressão e violência do marido. No primeiro ato, entra em cena o cego Eliás, irmão de criação de Ismael. Quando a Virgínia soube sobre a chegada do branco Eliás quer vê-lo e acaba por seduzi-lo. Eliás confessa-lhe que foi Ismael quem o cegou de propósito, não podendo suportar o facto de Eliás ser branco. No segundo ato, a tia de Virgínia conta a Ismael sobre o adultério da mulher e Ismael acaba por matar Eliás. Também sabemos que foi Virgínia quem matou todos os filhos de casal porque eles foram pretos. No momento está grávida com o filho de Eliás que para ela representa uma esperaça e uma saída da vida insuportável com Ismael. Terceiro ato desenrola-se 16 anos depois, Virgínia deu luz a menina branca Ana Maria. Sabemos que Ismael tem relação sexual com a menina e que a cegou ao propósito para ela não saber que esse é preto. Ao contrário, Ismael convence Ana Maria que ele é o único branco no mundo. Virgínia tenta persuadir a filha para fugirem juntas, dizendo-lhe a verdade sobre o pai. No entanto, Ana Maria odia a sua mãe e não quer acreditar que Ismael é preto. No fim da peça Virgínia convence Ismael que o ama e juntos deixam Ana Maria morrer no mausoléu do vidro. A peça segue o plano de drama clássico grego e podemos ver aqui um legado à história de Médeia que matou os seus filhos para se vingar do seu marido Iáson. Na peça Anjo Negro, Virgínia mata os filho não só para se vingar de Ismael, mas a razão condutor do ato é o fato de os filhos serem pretos. O problema racial é, então, o tema principal da obra e representa, também, uma refleção da situação social no Brasil da época de Nelson Rodrigues. Todos os personagens na obra odiam os pretos. Mesmo o preto Ismael, esse tentou toda a sua vida libertar-se da sua cor. No entanto, mesmo tendo successo como um médico rico respeitado pela sociedade, nunca conseguiu sentir-se aceito pelos outros. Sabemos que Ismael sempre queria violar uma mulher branca, que cegou o seu irmão de propósito por ele ser branco e, sobretudo, que também odiava os seus filhos pretos que teve com Virgínia. O fato de ser preto condena a pessoa a uma vida depreciada. O que é pior nesta situação é que não é só a sociedade quem oprima a pessoa preta, mas é a pessoa própria que não se sente aceita nem respeitada nesta sociedade e, sobretudo, o preto não respeita e acieta a si mesmo. Ao contrário, o coro, que representa o povo brasileiro, é representado pelas mulheres pretas, isto faz o leitor perguntar-se como é possível que numa sociedade onde os pretos são a maioria da população poder existir uma discrimanação racial tão forte. Ao lado deste problema racial, o tema da violência aparece em todos os atos. Relações crueis em família, decomposição dela, odeio, vingança, tudo isto cria a imagem de classe média brasileira. Nelson Rodrigues aqui começa a crítica da sociedade da sua época. Mostra-nos a hipocricia, depravação, perversidade – os tabus que no futuro serão comentados pelos autores como, por exemplo, Rubem Fonseca. Virgínia parece, no início da obra, ser uma vítima de Ismael, oprimida, desesperada, mata os seus filhos como um protesto contra a vida que é obrigada viver. Mas durante a obra, entendemos que não há vítimas nesta peça, ou seja, as vítimas são todos. Na minha interpretação, se nos libertamos do contexto histórico e social, podemos ver este problema de raça como um problema de ser diferente. A cor pode ser substituida por uma caraterística qualquer, que não é aceita pela sociedade nem pela pessoa mesma. Vemos os resultados desta opressão, que não determina só o oprimido mas a sociedade toda.